No dia doze de junho, realizou-se audiência pública no Supremo Tribunal Federal, convocada pelo Ministro Dias Toffoli, para discutir a questão do direito ao esquecimento.
A convocação da audiência não se deu à toa: o Supremo está prestes a julgar o Recurso Extraordinário oposto pelos familiares de Aída Curi, que foi brutalmente assassinada em 1958, no Rio de Janeiro. Os parentes movem ação contra a Rede Globo, alegando, em síntese, que a emissora trouxe à tona a desgraça ocorrida há 50 anos, explorando, de forma antiética, a imagem da vítima e de seus familiares.
O tema, que inclusive foi pauta do enunciado 531 da VI Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal, é polêmico e deve ser observado com cautela, independentemente da posição que é defendida.
A propósito, existem três posições delineadas: a primeira, do pró-esquecimento, defende, preponderantemente, a dignidade da pessoa humana, entendendo que a direito da pessoa à reserva sobrepõe o direito à informação. A segunda posição, pró-informação, considera o direito ao esquecimento como um tipo de censura, invocando a liberdade de informação para basear o argumento. Finalmente, a terceira posição, chamada de intermediária, argumenta que o direito à informação e a dignidade da pessoa humana, como princípios fundamentais, não possuem hierarquia e, assim, deve-se avaliar caso a caso, objetivando uma ponderação entre os princípios.
O curioso é que os Tribunais Brasileiros já se posicionaram de maneira divergente em casos que discutem o direito ao esquecimento. A corrente pró-informação se vê representada, por exemplo, pela decisão do STF que afastou a exigência prévia de autorização para biografias. Já os defensores pró-esquecimento, recordam a decisão do STJ no caso da Chacina da Candelária, que condenou a Rede Globo ao pagamento de indenização por mencionar o autor da ação como um dos partícipes do crime.
Outra ação bastante polêmica que invocou o direito ao esquecimento, foi a proposta pela outrora Rainha dos baixinhos, Xuxa Meneghel. A ação, movida contra o Google, buscava que a empresa excluísse de sua pesquisa qualquer conteúdo buscado para a expressão “Xuxa pedófila” – o termo rememora cenas do filme “Amor Estranho Amor”, que contém, supostamente, cenas sensuais entre a apresentadora e um menor de idade.
No caso acima, o Ministro Celso de Mello considerou constitucional a decisão proferida pelo STJ, onde a Ministra Nancy afirmou, entre outros argumentos, que “não se pode, sob o pretexto de dificultar a propagação de conteúdo ilícito ou ofensivo na web, reprimir o direito da coletividade à informação”.
Fato é que o assunto é espinhoso por, basicamente, colocar princípios fundamentais diversos em rota de colisão. Compreende-se o direito ao esquecimento não como uma ferramenta de censura para apagar fatos ou reescrever a história, mas, sim, como um mecanismo para privilegiar o mais importante dos direitos da personalidade: a dignidade da pessoa humana.
Existem três contextos principais que o direito ao esquecimento merece, nos parece, ser privilegiado. O primeiro, é a ressocialização de réus condenados. Quem pagou sua pena – branda às vezes, é verdade, mas essa é outra discussão – merece um novo começo e, convenhamos, um programa jornalístico que rememora crimes de 10 anos atrás em absolutamente nada ajuda. O segundo, remete-se ao caso que o STF está prestes a julgar: o direito das vítimas de crimes e seus familiares; e, por último, o direito ao esquecimento na web, quando vídeos, imagens e até mesmo informações ofendem o direito à intimidade.
Frise-se: não se apoia, aqui, apagar o fato removendo a notícia da história – até porque precisamos nos lembrar e estudar o passado para projetarmos o futuro – mas sim evitar a exposição desnecessária, o sensacionalismo e o superinformacionismo.
De toda forma, aguardemos ansiosos o julgamento do recurso, que terá repercussão geral. Fica a torcida para que a medida seja aplicada de forma harmoniosa aos casos concretos, evitando-se censura, mas buscando, também, o bem-estar de quem se sente injustiçado.