Já é de conhecimento no meio jurídico e empresarial que o capital das sociedades, em especial sociedades limitadas e sociedades por ações, pode ser integralizado mediante contribuições em dinheiro ou qualquer outra espécie de bens, desde que estes últimos sejam suscetíveis a avaliações financeiras.
Tem se tornado usual a integralização de capital mediante conferência de bens imóveis, veículos, maquinários, direitos de uso de marca, licenças de patente, ainda que o meio mais comum seja a contribuição em dinheiro.
A pergunta que tem surgido sobre as possibilidades de integralização é: E por que não integralizar com criptomoedas? Não existem dúvidas quanto a legalidade de integralização com bens, mas e quanto às criptomoedas? Poderia o capital de uma sociedade ser integralizado com esse novo meio de circulação de valores?
Esses e outros questionamentos foram pautados pela Junta Comercial do Estado de São Paulo (JUCESP) ao Departamento Nacional de Registro Empresarial e Integração (DREI), em Brasília, órgão vinculado ao Ministério da Economia e que tem entre as suas atribuições estabelecer as normas relacionadas ao registro de comércio e solucionar dúvidas decorrentes de interpretação de leis.
Desta forma, foi editado o Ofício Circular SEI nº. 4081/2020, de 1º de dezembro de 2020, que, em linhas gerais, reconheceu que não existe vedação legal que proíba a integralização do capital social com criptomoedas devendo, contudo, as juntas comerciais para fins de registro dos documentos societários que, porventura, envolverem o uso de criptomoedas, respeitar as mesmas regras aplicáveis à integralização de capital social com bens móveis.
O Ofício Circular tem como norte principal artigos do Código Civil e da Lei das S/A, bem como manifestações do Banco Central do Brasil e da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), e entende que “(…) tais ativos virtuais, a depender do contexto econômico de sua emissão e dos direitos conferidos aos investidores, podem representar valores mobiliários, nos termos do art. 2º da Lei nº. 6.385/76.”
Além do Banco Central e da CVM, a Secretaria da Receita Federal do Brasil considerou as criptomoedas como ativo financeiro e exige que os contribuintes as indiquem, em campo específico, na declaração anual do Imposto de Renda, pelo valor de aquisição. O que corrobora o entendimento de que as criptomoedas devem ser consideradas bens, pois possuem avaliação pecuniária, possibilidade de negociação e utilização de maneiras variadas.
A circular ainda ressalta que tanto o artigo 997, inciso III do Código Civil quanto o artigo 7º da Lei 6.404/1976 (Lei das S.A) existe a previsão de que a sociedade poderá ser constituída com contribuições em dinheiro ou em qualquer espécie de bens suscetíveis de avaliação, ou seja, as criptomoedas são totalmente passíveis de serem integralizadas a capitais sociais.
O ofício ressalta, ainda, que não existem formalidades especiais a serem observadas pelas Juntas Comerciais, devendo ser respeitadas as mesmas regras aplicáveis à integralização de capital com bens móveis.
Com isso, a tendência é de que para fins práticos os ativos comecem a ser integralizados em criptomoedas, ampliando a possibilidade de iniciar novas empresas e aumentar o capital social.