Cuidar do meio ambiente, promover impacto social positivo e adotar uma conduta corporativa ética deixaram de ser meras ações futuras para serem consideradas mandatórias às organizações que desejam progredir na era do capitalismo consciente
Estamos em 2021 e é inevitável reconhecer que cuidar do meio ambiente, promover impacto social positivo e adotar uma conduta corporativa ética deixaram de integrar planos de ação até então considerados utópicos para se tornarem condutas obrigatórias no mundo dos negócios. Na mais nova etapa do capitalismo consciente, a obsessão das empresas pode ser resumida em apenas três letras: ESG.
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DO QUE SE TRATA O ESG?
A sigla, em inglês, significa Environmental, Social and corporate Governance, algo como: melhores práticas ambientais, sociais e de governança em português.
O ESG surgiu pela primeira vez em um relatório de 2005, intitulado “Who Cares Wins” (“Ganha quem se importa”, em tradução livre), resultado de uma iniciativa, liderada pela ONU, que reuniu 20 instituições financeiras de 9 países para discutir e desenvolver diretrizes e recomendações sobre como incluir questões ambientais, sociais e de governança na gestão de ativos, serviços de corretagem de títulos e pesquisas relacionadas ao tema.
E a que conclusão esse relatório chegou? A de que a incorporação desses fatores ao mundo corporativo gerava mercados mais sustentáveis e melhores resultados para a sociedade. Hoje, 16 anos depois, o ESG se tornou parte da agenda das organizações e a sigla foi transformada num selo que atesta a responsabilidade de empresas e investimentos.
A começar pela preservação do planeta (E), uma empresa precisa ter iniciativas para proteger os recursos naturais, reduzir a emissão de poluentes e impactar positivamente o meio ambiente. Ela também deve ser engajada socialmente (S), adotando políticas de diversidade para o ambiente de trabalho e até projetos para reduzir a desigualdade na sociedade. Por fim, precisa cuidar da lisura dos processos corporativos (G), garantindo a independência do conselho de administração e investindo em mecanismos para impedir casos de corrupção, discriminação e assédio.
O E foi a primeira letra a ganhar destaque pelo mundo. Os graves problemas ambientais provocados pela ação humana despertou a atenção de muitos governos ao redor do globo, que passaram a estabelecer regramentos que buscam coibir o desmatamento, a caça de animais silvestres, a poluição da água e a emissão de gases poluentes. Por mais elementares que sejam os pilares social e de governança, ainda é comum, no entanto, que empresas concentrem suas iniciativas ESG na parte ambiental – um grave erro.
Um exemplo muito claro do impacto negativo provocado pela falta de preocupação com os valores S e G é o de João Alberto Silveira Freitas, que faleceu, após ser espancado, no ano passado, por dois seguranças numa unidade do Carrefour. Esse ato brutal de desumanidade provocou enorme prejuízo à sociedade e também à rede de supermercados, que se viu obrigada a fechar um acordo de 115 milhões para ações tardias de combate ao racismo.
A ausência de práticas voltadas à promoção da diversidade e ao antirracismo é, para além de um problema moral e social, um enorme risco de negócio. Sabendo disso, o executivo Gustavo Werneck, que assumiu o comando da produtora de aço Gerdau em 2018, chegou à companhia levantando a bandeira da diversidade: em junho daquele ano, enfrentou uma enxurrada de críticas ao adotar, nas redes sociais da companhia, a bandeira do orgulho LGBTQIA+.
“Temos um programa para influenciar os nossos fornecedores para que eles implantem programas de diversidade e inclusão. Em breve, os fornecedores da Gerdau que não tiverem isso implantado, não vão mais fornecer para nós. Vai ser quase um pré-requisito”, afirmou.
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E O QUE OS ESCRITÓRIOS DE ADVOCACIA TÊM A VER COM ESG?
Quem pensa que os critérios de ESG não se aplicam aos escritórios de advocacia está muito enganado. Há uma vasta gama de oportunidades surgindo para os empreendimentos jurídicos, inclusive os pequenos e médios.
Os escritórios devem aplicar os valores ESG no relacionamento com a sociedade: o que o profissional do Direito pode oferecer para a sociedade como um cidadão que se insere naquele meio social?
Com isso em mente, os escritórios, embora possuam uma imagem de empresa tradicional, devem ser uma organização moderna. Suas equipes precisam se dar conta de que chegou o tempo de transformar o respeito às pessoas, valor subjetivo que muitas vezes já faz parte de sua cultura organizacional, em ações objetivas que efetivamente provoquem mudanças em sua estrutura.
A diversidade é um fenômeno observável. Se vamos a um shopping, vemos negros, mulheres, transexuais. A questão, então, é: como fazer com que essa realidade seja refletida na composição da equipe de um escritório? A resposta começa pelo investimento em mentorias, uma espécie de escola, para que a diversidade e a inclusão sejam transmitidas como valores de organização. Em seguida, podem, então, ser postas em prática ações efetivas de direcionamento de vaga, de modo a tornar essas equipes mais diversas e inovadoras.
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CONFLITO QUE NÃO EXISTE
Não somos obrigados, enquanto tomadores de decisão dentro das empresas, a escolher entre construir um mundo mais sustentável e atingir bons resultados financeiros. Muito pelo contrário: cuidar do meio ambiente, preocupar-se com os problemas sociais e adotar melhores práticas de governança são, na verdade, práticas que alavancam o desempenho das empresas – e esse é um dos motivos pelos quais a sigla ESG se tornou tão popular.
Organizações que adotam boas práticas ambientais, sociais e de governança percebem diversos impactos positivos, como maior lucratividade e até uma melhora em seu valor de mercado.
Em outras palavras, negócios que se comprometem com as melhores práticas de gestão acabam tendo uma operação mais sustentável em diversos aspectos, incluindo o econômico e na gestão de riscos. Como consequência, geram resultados melhores ao longo do tempo. Os valores ESG estão em prática hoje. E você – vai deixar para amanhã?
Autor: João Guilherme Torres
Advogado contratualista e Presidente do Comitê de Diversidade do Gaiofato e Galvão